29 de maio de 2009

Elogio ao Amor

O amor é esta constante ilusão, é este constante fogo que não se absorve. 
O amor é isto.
O amor é mão que se dá, é mão que espera que outra passe nos olhos e os leve à morte.
O amor são as conversas sem palavras e os beijos que se trocam clandestinos, aquando do fim das horas.
O amor não é ódio. É frustração, é um sentir sem chão e um morrer em fome.
O amor é viver envelhecido junto do peito que se escolhe esvaziar.
É um abraçar contínuo da solidão.
O amor é esperar. Esperar até que a escolha seja a palavra de ordem.
O amor é desunião. É um viver independente enquanto o cíume se leva nas costas.
O amor é isto. É silêncio que se agrada e barulho que se constrói.
O amor é insuportável. É dor, é sufoco que se guarda quente nas entranhas.
O amor é não ser imune. É ser vulnerável, é cair, voltar a cair e deixar cair.
O amor é lugar comum.

24 de maio de 2009

Não temas meu amor, não temas estas palavras soltas que te escrevo neste dia de sol chuvoso. 

Oiçamos a voz do povo num café de uma rua de Lisboa e brindemos aos dias que passam depressa e aqueles que esperamos ter guardados nas prosas que nos escrevemos. 

Não temas o frio nem mesmo o calor que te invade quando no escuro das noites nos encontramos perdidos. 

Faz de conta, meu amor, faz de conta que não sabes que nos somos proibidos. 

Nas músicas que escolhemos conquistámos palcos sem dono e batem palmas os que connosco brindam a esses dias fugidíos. 

Não fujas, meu amor, não fujas às mãos dos que nos querem plantar na terra. Não fujas ao tempo nem à pele rasgada. É inevitável dormirmos sobre o chão, cruzarmos o peito e darmos aos ventos o nosso corpo queimado e feito em pó.

21 de maio de 2009

Crónica Primaveril

Na constipação e afins vive um bicho chamado Espirro.
O Espirro é altamente incomodativo, de vez em quando lembra-se de gerar contracções involuntárias no rosto até finalmente se fazer ouvir.
O Espirro instala-se, é o típico amigo de copos e poucas conversas.
Muitos de nós chamamos o Espirro em situações de profunda comichão no orgão olfactivo.

A Sra. Dra. Felicidade veste-se, prepara a maquilhagem, pinta os lábios de vermelho e, aquando do seu desfile pelas ruas da cidade, um aroma a Chanel Nº5 é largado no ar.
(Vejam agora isto em câmara lenta)
Automaticamente, os olhos encolhem, a comichão invade as fossas nasais, morde-se a língua, na esperança de nada sair, mas a boca inicia já o seu processo convulsivo e autónomo de abertura dos maxilares e, um sonoro grito, vindo das profundezas dos nossos pulmões sai. Com ele, saem todos os filhos e seus descendentes.

A mãe de Espirro geralmente acorda na Primavera.
As flores nascem, o sol brilha quente lá no alto, a paixão aquece e, subitamente, eis que, sem aviso, chega! Os pulmões começam a inchar, o corpo amolece, os olhos semicerrados começam a pesar e a sensação de se fumarem 500 cigarros invade toda a garganta.
É a Mãe da igualdade entre os homens, ela segue-nos toda a vida, alimenta-nos e morre connosco. Ninguém está imune ao seu poder maternal.
Espirro, submisso e obediente, responde a todos os desejos da Grande Mãe.
Quando ela lhe diz: “Filho, abraçai José Pais. Ele estará sentado a uma mesa com toda família e amigos”. Espirro obedece e, abençoa assim José com o poder da propagação da sua espécie.
A seguir, pouco satisfeito, decide ainda abençoar Edmundo.
Edmundo estava em frente a Cristiana... O tempo parara, os olhares brilhavam, os sorrisos eram partilhados e os cabelos compridos de Cristiana esvoaçavam. Sem aviso, Edmundo deixa sair um sonoro e esganiçado grito.
O filho de Espirro nascera! Aleluia! Aleluia!

Sara Almeida

9 de maio de 2009

Muitas são as cartas que já te escrevi.

Já pensei, um dia, em talvez as compilar e publicar um livro.
Talvez se chame Fuga (hmmm... tão cliché!). Nós somos essa fuga, somos esse desejo que não se consome e que guardamos nos agradáveis silêncios que tantas vezes passamos.
Não pretendo escrever-te mais. 
Esta carta é só mais uma, entre as folhas de papel que guardo nos cadernos que designei para ti.
São tantos os dias que passo à tua procura. 
Corro depressa, ando devagar e, muitas vezes, sento-me no chão, cansada, com o coração a um compasso de espera.
Daqui a 20 anos telefonar-te-ei, serei a mulher que procurarás pois eu não mais te procurarei.

Sara Almeida